Escrito por Jorge Bastos | |
Quinta, 14 Maio 2009 | |
Aldeia em processo de desertificação A Barrenta é hoje “um local de culto para os tocadores de concertinas na zona centro”, afirma Hermano Carreira. Pelo Verão, a pacata aldeia acolhe no seu seio pessoas oriundas de todo o país. O Encontro Nacional de Tocadores de Concertinas da Barrenta é já um dos ex-líbris do concelho. Todavia, “nem tudo são rosas”. A Barrenta, à semelhança de muitos lugares do interior do país, não consegue fugir ao fenómeno da desertificação. Nos últimos dois anos faleceram cerca de dez dos cinquenta habitantes que ali viviam. Actualmente, a aldeia é habitada por uma população maioritariamente idosa e vê dificultada a tarefa de captar novos habitantes. A impossibilidade de se construir ou os constantes problemas com as telecomunicações são obstáculos difíceis de ultrapassar. Com tantos “contras”, o êxodo rural acaba por ser a solução para os jovens que ali habitam. Hermano Carreira chegou à Barrenta há cerca de 15 anos, vindo da zona de Setúbal. Os ares da serra e a paisagem envolvente rapidamente fizeram efeito. “Foi amor à primeira vista”, conta. Atento a tudo o que diz respeito à Barrenta, sente como ninguém a desertificação: “nos últimos dois anos fiquei sem vizinhança”. O isolamento trouxe uma sensação de insegurança e a certeza de que a aldeia precisa de mais para se desenvolver. O morador lamenta que não hajam apoios para a fixação dos jovens naquele lugar: “quem quiser viver aqui terá de recuperar casas que existam”, diz confessando não perceber “a filosofia do PNSAC”, que não deixa construir na Barrenta, mas “continua a autorizar a reflorestação de área ardida com eucalipto”. Custódia Vicente, moradora na aldeia, reforça esta ideia e diz não perceber o “porquê” de o Parque não deixar construir. A idosa lamenta o isolamento a que a aldeia está votada: “nos últimos anos saíram da Barrenta muitos jovens. Podem ter terrenos, mas não lhes é concedido o direito a fazer casa”. Depois, vem o eterno problema das telecomunicações. Na aldeia não há rede móvel, as chamadas entre telefones fixos caem com facilidade e a Internet de banda larga continua a ser apenas um sonho. Fruto disso, não só os inconvenientes são notórios, como a factura pesa no final do mês: “tenho de ter o telefone fixo porque o telemóvel não tem rede. Caso contrário, não teria telefone fixo, naturalmente”, diz Hermano Carreira. O “pai das concertinas”, como é por muitos conhecido, lamenta que não haja “nenhum projecto proposto para o desenvolvimento da aldeia”, o que “está a contribuir para o seu declínio”. Isolados. Sandrina Carreira e Joaquim de Freitas optaram por viver na Barrenta. Contudo, rapidamente se viram perante dificuldades inesperadas. “A Internet móvel é lenta e está constantemente a cair”, afirmam. Em conversa com O Portomosense os jovens dizem sentir-se isolados, num lugar que lhes agrada mas que “não se mostra atractivo devido a este isolamento tecnológico forçado”. Nesta aldeia serrana, as coisas que, para muitos são simples se executar, são uma tormenta para este casal. Não pensam ter telemóvel e deixam, irónicos, a pergunta no ar: “para quê se não existe rede?”. O telefone fixo poderia ser a solução, todavia, este, em vez de dar muito, “dá pouco que falar”. Com tudo isto, Sandrina e Joaquim não tem dúvidas de que “é esta falta de sensibilidade que leva à desertificação das aldeias”. De acordo com outros moradores ouvidos pelo nosso jornal, “até a caixa de correio que existia no lugar desapareceu”. “Registámos uma avaria e fizemos a recolha para a arranjar”, justifica o responsável pelo Centro de Distribuição de Porto de Mós / Batalha dos CTT, acrescentando que a mesma já foi, entretanto, reposta no lugar. Alvados sofre do mesmo mal. Quem corrobora com a ideia de que a Barrenta atravessa um claro processo de desertificação é o presidente da Junta de Freguesia de Alvados, António Pardal. O responsável afirma que “o problema com as telecomunicações parece um pouco complexo” e que em Alvados, também há zonas onde não há rede de telemóvel. Todavia, “o peso da freguesia em termos de votos é pouco”, sendo que “falta sensibilidade” às empresas de telecomunicações para resolver esta situação. António Pardal recusa, no entanto, a ideia que só a Barrenta está a ver a sua população a diminuir, seja por falecimento ou por abandono da localidade. Em Alvados “morreram mais de trinta pessoas nos últimos dois anos e nasceram apenas seis”, lamenta. Por último, o responsável garante que “o lugar da Barrenta não está minimamente desprezado pela Junta de Freguesia” e que tudo o que estiver ao seu alcance “será feito”. |